CAMPING – PERSONS: AMOUR [ESTREIA]


-Na verdade, todos já tivemos um amor e um peixe de aquário que morreu na primeira semana. – confessava Teresa.

Estavam ambos deitados, no longo relvado que circundava a torre Eiffel, conhecida em todo o mundo como o grande símbolo de Paris e de França. Observavam as estrelas, era Verão na Europa e toda a sua volta encontrava-se à sua volta uma imagem já tão clássica quanto a própria torre, turistas a tirar fotos para mais tarde recordar o tão grande momento em que viram uma enorme e secular estrutura de aço com não sei quantas centenas de degraus. Teresa cansou-se de olhar para as tão belas constelações e virou a cabeça para o lado, olhando para o lado.

-Parece que a maior parte do mundo está doida! – disse suspirando.

-Nisso concordo contigo!

-E a parte que não está doida está completamente furiosa, e a parte que não é doida nem furiosa é apenas idiota.

-Tem calma, vais ver que tudo vai melhorar!

-Não tenho outra hipótese, só esperar pelo fim de tudo. É um trabalho difícil, o trabalho mais difícil imaginável.

Três horas antes –

-Mãe eu preciso de ir, vai correr tudo bem, confia em mim! – as palavras ecoavam pela cabeça de Teresa. Sentada na cama do seu pequeno e velho apartamento situado nos arredores de Paris, a cidade mágica. Porém, Paris não era assim tão mágica para Teresa. Passaram-se dois anos desde que veio para cá, no inicio tudo parecia correr bem. Os sonhos, esses eram grandes, os sonhos. Ir para Paris, viajar e conhecer pessoas novas, ser cantora e ter um êxito mundial. Sem a ajuda dos pais, sem amigos, sem qualquer suporte ou destino. Mas estava agora sentada no velho colchão, encostada à parede cinzenta e fria. Ao seu lado, como sempre, Jean. O seu namorado.

-Lembras-te quando nos conhecemos? Aquele dia, no café? – perguntou Jean.

-Sim, claro, lembro-me perfeitamente. – respondeu Teresa ao mesmo tempo que ligava a televisão. – porque é que esta merda não funciona? – reclamou batendo com o comando na parede na esperança que isso o fizesse funcionar.

-Fille de pute! Pour avec ce bruit! – ouviu-se instantaneamente vindo do outro lado da parede, a voz de uma mulher, nada calma por sinal.

-Vais vous baiser Margarete! – respondeu Teresa furiosa, Jean ria-se. Teresa voltou a virar-se para a televisão e o silêncio voltou a dominar o quarto por uns segundos até ser interrompido pelo som do velho homem que apresentava o telejornal.

-Queres sair hoje? – perguntou Jean intimidado com a fúria da companheira, metendo ao mesmo tempo a mão em cima do seu joelho para acalmá-la.

-Não! – respondeu determinada. – Hoje não me apetece. – concluiu.

-Porquê? Está uma noite ótima, é bem melhor irmos dar um passeio do que ficarmos aqui a noite toda a ouvir a Margarette resmungar. – relutou o rapaz.

-Já disse que não! Não me apetece sair de casa! – afirmou novamente.

Jean não insistiu, olhou para a televisão e começou a interessar-se pelas noticias que passavam. Teresa olhava em volta, com um olhar um pouco perdido para o apartamento que a rodeava. Era bastante pequeno e com uma decoração dos anos 60. Livros, cd’s de música estavam espalhados por toda a parte e as paredes eram opacas contrastando com as luzes amarelas que iluminavam todo o ambiente. Virou a cabeça lentamente para Jean, sentado ao seu lado e bastante concentrado a ver televisão.

-O que vamos fazer Jean? – perguntou com a voz algo abatida.

-Ver televisão? Disseste que não querias sair… – respondeu sem tirar os olhos das noticias.

-Não é isso estúpido, estou a falar da nossa vida. Não podemos viver assim para sempre, não quero que a minha vida seja assim Jean. – explicou.

-Não sei Teresa, é a vida. Não pudemos fazer nada! – respondeu ainda sem olhar para a cara de Teresa.

-Olha para mim estúpido! – gritou Teresa furiosa ao agarrar na cara de Jean e a virá-la para si. –Vamos sair daqui! Agora! – disse determinada e com algumas lágrimas nos olhos. Levantou-se, desligou a televisão e vestiu a camisola que tinha por cima de uma cadeira. Jean olhava-a confuso.

-Vamos onde? – perguntou.

Um ano e meio antes –

Perambulava sossegadamente por uma rua quase deserta, atravessou a estrada e encontrou um café, cafés são coisas que não faltam em Paris, mas aquele era especial. Tinha montras grandes que permitiam tanto a quem lá dentro estivesse como a quem cá fora passasse ver toda a vida ali à sua frente. Abriu e atravessou a velha porta de madeira que chiava levemente. Olharam-na quando entrou, o café, quase vazio, era ocupado por uma empregada, um casal e vários homens reunidos a comer. Sentou-se numa das mesas e a empregada apressou-se a perguntar-lhe se desejava alguma coisa. Limitou-se a pedir um copo de água, que foi, pouco depois levado pela empregada. A empregada era um pouco velha, um pouco baixa também. Olhava-a com curiosidade, nunca percebera como é que alguém conseguia passar a sua vida a servir cafés e copos de água. O seu sonho era ser cantora, uma grande cantora. Viajar pelo mundo e conhecer muitos lugares e pessoas, apaixoná-las completamente pelas suas músicas que tocariam o coração de qualquer um. Teresa observava o espaço à sua volta, o restaurante era preenchido por velhas mesas e velhos bancos de madeira que faziam lembrar um típico restaurante americano. Repentinamente reparou que um dos homens aproximava-se de si.

-Posso sentar-me? – perguntou sentando-se no banco à frente de Teresa.

-Já estás sentado. – respondeu a rapariga. – Aposto que fizeste uma aposta ali com os teus amigos para ver se me conseguias comer ou não. – disse.

-Chamo-me Jean e tu? – apresentou-se estendendo o braço sobre a mesa e abrindo a mão para a cumprimentar.

-Claudette! – disse apertando a mão desconfiadamente.

-Claudette Colbert? – perguntou curioso.

-Estás a tentar mostrar a tua inteligência para me agradar? – perguntou sorridente.

-Já devias saber que nós franceses somos grandes fãs de cinema. – respondeu o rapaz a rir-se. – E não te chamas Claudette e nem és francesa. – atirou.

-Nunca disse o contrário. – respondeu levando o copo de água à boca e bebendo o último gole.

-Tens uns lábios lindos! – disse Jean apoiando as mãos sobre a mesa e aproximando a sua cara da de Teresa.

-Chamo-me Teresa. – respondeu virando a cara para o lado, lá atrás ouviu-se automaticamente o riso dos amigos de Jean.

-Anda, vamos sair daqui, estou farto daqueles gajos. – disse determinado.

-Eu não vou contigo a lado nenhum, não te conheço! – respondeu Teresa chamando à atenção de uma empregada. – Larga-me! – gritou quando Jean lhe agarrou na mão e começou a puxá-la para fora do café.

Cá fora começaram ambos a correr, Teresa era puxada pelo destino, pela vida, por Jean. A empregada ainda veio a porta tentar ver se conseguia fazer alguma coisa, mas sem êxito.

-Animaux! – resmungou.

-Onde estamos a ir? – perguntou Teresa ofegante.

Jean não respondeu e continuo a correr, chegaram perto de um parque de estacionamento e de umas motos mal estacionadas. Jean retirou umas chaves do bolso e montou-se em cima da mota. – Anda, sobe! – disse determinado sobre o olhar indeciso de Teresa. – Confia em mim. – disse esticando a mão para ajudá-la a subir. Jean arrancou e pouco depois já andavam os dois pela estrada fora.

Teresa não sabia para onde ia, quem era afinal Jean ou o que estava sequer ali a fazer, mas queria aproveitar aquele momento como se fosse o último da sua vida. Não queria saber mais nada, parecia que pela primeira vez em anos, todos os problemas tinham desaparecido. Não existia mais nada e ninguém a não ser eles dois, a mota e a estrada escura sem destino. Não queria que aquela noite acabasse nunca. Pouco depois, aproximavam-se da torre Eiffel, via-se a mítica torre a desvendar-se por entre os ramos das árvores e cada vez mais perto.

-É lindo Jean! – afirmou encantada.

-É não é? Um dos monumentos mais belos do mundo, aqui, aos teus pés! – disse Jean como se soubesse daquilo que dizia.

Com os braços sobre os ombros de Jean, as suas mãos tocavam levemente sobre o peitoral musculado e desenvolvido. Os seus olhos brilhavam como os de uma criança ao receber um doce, a vida que tanto ambicionava estava ali, mesmo à sua frente. Pensou para si mesma que no dia seguinte iria tentar novamente e desta vez iria conseguir, iria ser uma grande cantora. Jean era provavelmente o homem da sua vida, apesar de não o conhecer ela sentia-o. Chegaram minutos depois, ele estacionou a mota enquanto ela tirava o capacete. Deram a mão e olharam ambos um para o outro, pareciam um casal completamente apaixonado. Caminhavam sobre o relvado em direção ao centro da torre, Jean queria mostrar-lhe uma coisa.

-Estás a ver isto? – perguntou o rapaz erguendo o braço para cima enquanto as cabeças de ambos olhavam para onde ele apontava. –A minha mãe trouxe-me aqui em pequeno, disse-me que algum dia iria chegar tão alto quanto o ponto mais alto desta torre, que fica exatamente ali. – apontou com mais precisão. –Não acho que ainda tenha chegado, nem que algum dia chegarei. Mas acredito que tu, irás chegar lá. Tenho a certeza disso. – disse confiante.

-Nunca pensei em conhecer alguém que me dissesse o mesmo. – revelou. –Os meus pais nunca me apoiaram na minha opção de vida. Mas não pude fazer nada, não me vejo a fazer outra coisa senão cantar.

-E hás de conseguir. – respondeu Jean dando-lhe um beijo. –Tens uns olhos lindos! – disse de seguida.

Por mais que aquela noite fosse mágica, passou rapidamente. Passaram ambos a noite em casa de Jean e Teresa acordou de manhã, Jean ainda dormia profundamente. Olhou para o teto e pensou que a sua vida, o seu futuro começara naquela noite. A partir de agora tudo iria melhorar.

Cinco minutos depois –

-Onde vamos Teresa? – perguntou Jean confuso ao mesmo tempo que desciam as escadas do prédio.

-Vamos onde estivemos à dois anos atrás! Torre Eiffel! – respondeu decidida.

-O quê? Estás a falar do quê? – perguntou Jean ainda baralhado.

-A noite em que nos conhecemos, levaste-me à torre! Precisamos de lá voltar, agora! – explicou.

Saíram do prédio repentinamente, atravessando a grande porta de madeira. Cá fora, sentia-se o ambiente de Verão, era um bairro típico dos arredores de Paris, com casas antigas, umas deslumbrantes e outras nem tanto. Pegaram ambos na mota de Jean e partiram novamente para o destino que os tinha juntado dois anos antes. Teresa queria sentir novamente tudo aquilo que tinha vivido há quase dois anos atrás, tentaria agora, no mesmo sítio.

No dia seguinte –

A noite passada tinha sido mágica para Teresa, a esperança de as coisas melhorarem tinha regressado após ter passado uma grande noite com Jean. Acordou, ela e Jean tinham dormido em casa dele.

-Bom dia amor. Dormiste bem? – perguntou Teresa virando-se para o lado. Jean não estava na cama.

Estranhando o facto, decidiu, na esperança que o namorado estivesse a fazer o pequeno almoço, ir à cozinha espreitar.

-Tens que te ir embora antes que ela acorde. Agora! – dizia Jean sentado no sofá enquanto uma rapariga sentada no seu colo lhe dava beijos.

-Não saio daqui sem me dares aquilo que eu quero, e o que eu quero és tu. – disse a rapariga com um ar sedutor pegando na sua cara e dando-lhe um beijo.

Depressa o sentimento de paixão foi sentido cada vez mais, começaram a tirar as poucas roupas que tinham enquanto Teresa espreitava por entre a porta. Nem queria acreditar naquilo que estava a ver: Jean o rapaz que julgava ser o homem da sua vida e com quem estava há quase dois anos da sua vida estava ali, a ser beijado e a fazer sexo com outra, outra que provavelmente não era a primeira vez que ali estava. Teresa vestiu-se e saiu a correr, Jean foi atrás dela.

-Não vale a pena vires atrás de mim Jean! Desaparece da minha vista! – gritou enquanto descia pelas escadas abaixo.

Jean ficou paralisado no cimo das escadas, ouviu Teresa descer os últimos degraus e a fechar a porta do prédio. Cá fora, Teresa lavada em lágrimas sentou-se no degrau do passeio. Estava um dia lindo, mas ela estava a chorar, enquanto à sua volta tudo e todos estavam alegres. Teresa limpou as lágrimas, levantou-se, meteu a mão no bolso enquanto dava passos curtos e lentos, como se estivesse indecisa, em direção a um cabine telefónica do outro lado da rua. Pegou no telefone, inseriu as moedas e começou a marcar o número. Ouviu o som de chamada e segundos depois alguém atendeu.

-Estou?

-Mãe? Sou eu, quero voltar para casa mãe.

O que achou da estreia de Camping – Persons? Não perca Domingo o 3º episódio de Camping!

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